O olhar certo sobre a cruz

Sao Cirilo_30 Mar 15 (5)Já não falta muito para celebrarmos a Páscoa. Como final deste caminho de Quaresma, tempo de preparação que começou logo após o Carnaval, todo o mundo cristão relembrará a morte de Jesus na cruz. É habitual neste tempo as procissões e as vias-sacras, e até a reposição de filmes sobre o tema. A cruz é, de facto, o grande símbolo da fé cristã, que a pouco e pouco se foi sobrepondo a outros símbolos (o peixe, o cordeiro) inicialmente também usados. Ao falarmos da cruz, tantas vezes lhe associamos sofrimento, dor, o peso de algo que custa, às vezes muito. E ainda por cima sem se perceber a sua razão e/ou o seu sentido. E por isso é expressão popular o “ter que levar as suas cruzes”, com resignação e sem grandes perguntas.

Mas este olhar sobre a cruz não podia estar mais longe da verdade. A cruz não é um fim em si mesmo, nem tem qualquer sentido por si própria. A vida de Jesus (assim como alguns outros exemplos na história da humanidade) foi sempre e em cada momento um caminho de entrega. Quando era fácil e quando era difícil, quando foram evidentes os resultados e quando eles tardaram em aparecer (ou não apareceram de todo), quando apetecia e quando não apetecia nada. Uma vida de fidelidade e entrega. Por isso a cruz simboliza não o que “custa”, mas a entrega, que tem sempre algum “custo” associado. “No pain, no gain” (“sem dor não há ganho”), já diz o ditado inglês. E sabe-o quem se dedica a qualquer “projeto” na vida, seja ele um curso, um emprego, um casamento ou a paternidade.

Acaba por ter graça ler o trabalho do Centro como um (re)ensinar a viver bem a cruz, a todos aqueles que vêm até nós. Há quem chegue desanimado, “derrotado” por uma vida cheia de dificuldades. Há quem venha iludido, pensando que pode haver crescimento e ganho sem “cruz” (isto é, sem esforço). Há quem venha desamparado, sem ninguém ao lado com quem partilhar o seu caminho. Aqui, reaprende-se a olhar para as cruzes da vida, sabendo que elas fazem parte mas que não são o todo. Reaprende-se a “batalhar”, já que nada se constrói sem esforço. E reaprende-se a confiança, a sabedoria de que a cruz não é o final do caminho. O fim é mesmo a luz do Domingo de Páscoa, a alegria após a entrega (ou melhor, durante todo o caminho de entrega!), e a (auto)confiança reconquistada. Seja bom final de Quaresma para cada uma e um, e que o olhar certo sobre a entrega/sobre a cruz vá crescendo em todos até à Páscoa!

P. Filipe sj